sexta-feira, 9 de novembro de 2007

Quando perdemos a inocência...

O livro "Ópera de Sabão" de Marcos Rey narra a história de uma família paulistana no dia do suicídio de Vargas. Assim como acontece no país, a vida da família vira de cabeça para baixo. Inspirado nas soap opera da Era do Rádio, o livro é “bem amarradinho”. A história dos integrantes da família Manfredi é cheia de idas e vindas e coincidências propícias para o conflito das personagens. Dividido em duas partes, o livro começa no ano de 1954 e depois dá um salto de quinze anos no tempo. A trajetória dos integrantes da família permite perceber as mudanças que estavam acontecendo no país naquela época.

A primeira parte da história é engraçada, flui doce e romântica, lembrando um país de muitos anos atrás. A segunda parte tem um clima diferente, triste. No enterro do patriarca é possível saber o que houve com as personagens e um clima de nostalgia e perda da inocência pode ser percebido. O voluntarioso pai, que não aceitava o casamento da filha com o homem mais velho e rico, decide não dar mais opiniões quando começa a receber uma pensão do genro. A mãe, uma defensora da moral e da luta contra o aborto, abandona seus ideais para “resolver o problema” do filho que engravidou a namorada.

É possível fazer um paralelo com as mudanças culturais e a vida política do Brasil. Os filhos mais novos sacrificam o amor por “bons casamentos” e não se importam com os problemas do país, já que o Brasil vive o Milagre Econômico e todos estão ganhando muito dinheiro com isso – uma atitude semelhante à dos pais, citada acima, que trocaram os ideais e o direito de falar o que pensavam por vantagens. Em contrapartida, o filho mais velho decide lutar contra a Ditadura e recusa o dinheiro e as vantagens que o cunhado – o poder corruptor – oferece e se torna um foragido.

De certa forma, os personagens são uma representação de boa parte do povo brasileiro, que apoiou ou simplesmente se omitiu enquanto regime ditatorial ofereceu vantagens econômicas. As escolhas que eles fizeram mostram as mudanças no comportamento cultural do país, que se tornava industrial, moderno e menos inocente.
http://www.marcosrey.com.br/home.htm é o endereço do sítio do autor na internet e no link
http://www.canaldaimprensa.com.br/canalant/midia/dnov/midia1.htm é possível saber como nasceram as soap operas.
Para ler uma breve biografia do autor, procure em
http://www.teledramaturgia.com.br/marcosrey.htm

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

A Missa do Galo

Escrito em 1895, durante a maior fase do cronista Machado de Assis, "Missa do Galo" é talvez seu conto que mais fascínio desperta entre seus leitores e críticos. Em vez de um enredo repleto de lances e movimentos, o conto traz uma narrativa psicológica bastante intensa. O leitor tem a possibilidade de ir muito além daquilo que é aparentemente narrado.

O conto é centrado em uma quase história de amor entre Nogueira, de apenas dezessete anos, e uma mulher de trinta anos, Conceição. Ela é casada com Menezes, escrivão, e Nogueira vive na casa deles devido ao parentesco com a primeira esposa do escrivão.

Na noite de Natal, o jovem está lendo, na sala da frente, enquanto espera por um amigo com quem iria à Missa do Galo. Nogueira, completamente envolvido na leitura, nem percebe a chegada de Conceição. Os dois iniciam, então, uma conversa carregada de insinuações.

Mais velha e experiente, cansada da constante ausência do marido, ela parece querer conquistar o rapaz. As expressões faciais e corporais expressando sensualidade que acompanham suas falas demonstram suas pretensões. Porém, as atitudes ficam apenas no âmbito das tentativas, marcadas por avanços e recuos, que constituem o clima da história.

Nogueira, tímido e bem mais jovem, tem o seu primeiro encantamento amoroso. A medida que a conversa avança, ele vai se envolvendo naquele clima de sedução. Contudo, após uma hora de conversa, chega o amigo que lhe fará companhia na ida à Missa do Galo, quebrando o encanto e impedindo a concretização do romance.

Por ser narrado em primeira pessoa, o leitor conhece apenas a impressão que Nogueira tem do fato. Não há como afirmar se Conceição realmente está inserida no mesmo clima de sedução percebido por ele. Para Nogueira, no entanto, a noite foi profundamente marcante.

O portal "Domínio Público" disponibiliza o download do conto na íntegra:



Comédias da Vida Privada

As Noivas do Grajaú


Em comédias da vida privada, temos um retrato da classe média, com heróis anôniomos, os grandes e pquenos gestos a complicada engenharia familiar, o ambiente de bares, o cotidiano de casais adulteros e fiéis, uma mescla que mostra com genilaidade e bom humor de Luis Fernando Verissimo, um retrato do que poderiamos chamar de "o homem médio brasileiro".


O crônica a ser analizada hoje, é "As noivas do Grajaú", a partir da colcha de retalhos cultural que é apresentada no livro, notamos nela um tipo de manual, para homens casados que querem uma noica no Grajaú, e olhe bem, é noiva e não amante, pois quem possue uma noiva naqule bairro, é mais fiél a esposa do que ela merece, essa afirmação parece um pouco descabida, porém os eventos que se sucedem, com a "noiva teórica" acaba confirmando.


Basicamente as jovens do bairro, são mais castas que as outras, o noivo em potencial demora duas semanas para encostar não na moça mas no portão da casa dela, lembre-se não haverá na sua relação com ela nenhuma promessa sexual, com sorte só depois de um ano e meio de noivado firme você conseguirá dar uma mordidinha na orelha dela, e ela pedirá que você nunca mais fassa isso por que ela sente cócegas e quase perdeu o brinco. As recomendações seguem durante a crônica sempre exaltando a pureza dessas moças.


É claro que sua noiva tem uma familia muito atenciosa, o irmão ex-pára-quedista, o Irmãozinho que tem como principal brncadeira chutar sua canela e sair correndo, a mãe que tem bigodes e uma capacidade sobre humana de ver no escuro, e o pai da moça que está sempre com o coldre preso a cinta, é claro que não está armado, mas o tamanho do coldre já é um aviso a qualquer que queira macular sua filha.


Com tantos problemas e dificuldades, quando chega as seis horas e mãe da moça acende a luz do alpendre, é o sinal para que você vá embora, ela gospe o chiclé e pergunta se você vao voltar amanhã e infelizmente você volta.
Para saber mais sobre o autor:

terça-feira, 6 de novembro de 2007

Mineiro de Juiz de Fora José Rubem Fonseca (11/05/1925), escritor e roteirista de cinema é formado em direito, e foi como comissário, na polícia, que começou sua carreira. Não trabalhou em campo por muito tempo e cuidou do departamento de relações públicas até ser exonerado. Foi estudar na New York University administração de empresas e exerceu tal função na Light. José Rubem também se especializou em psicologia na Escola de Polícia e lecionou na Fundação Getúlio Vargas.

Pai de três filhos e viúvo, hoje se dedica exclusivamente a literatura. Preferindo o anonimato é descrito por amigos e familiares como uma pessoa simples afável e de ótimo humor. José Rubem foi muito influenciado, pelos anos dedicados a polícia. Muitos fatos de sua vida são relatados em seus textos que tratam da violência urbana mostrando por diferentes ângulos as mazelas da sociedade e o grande abismo entre as classes alta e baixa. Seus livros foram lançados tanto no Brasil como no exterior e fez muito sucesso tanto entre os leitores quanto à crítica.

Ganhador por cinco vezes do Prêmio Jabuti, (1970, 1984, 1993, 1996 e 2003); também recebeu o Prêmio Luis de Camões, pelo conjunto de sua obra; Coruja de ouro, roteiro Relatório de um homem casado; Kikito de ouro do Festival de Gramado, roteiro de Stelinha e Prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte, roteiro de A grande arte.

O conto a ser analisado é “Feliz Ano novo”. Recomendado apenas para os de estômago forte, tem uma linguagem seca e direta. Narra um assalto de três ladrões sem escrúpulos algum a uma “casa bacana que ta dando festa”. Surpreendente ,não é algo que se lê em qualquer lugar.

Para conferir este e vários outros contos além de entrevistas e até partes dos filmes de José Rubem Fonseca acesse http://portalliteral.terra.com.br/rubem_fonseca/index.htm.

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Piedra Sola

Cena de Netto Perde sua Alma, filme de Tabajara Ruas e Beto Souza

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O pampa gaúcho[1] foi palco de gloriosas batalhas e angustiantes derrotas. Foi o local onde nossos antepassados forjaram sua identidade pranchando adagas em vastas extensões de campo. Esses cruentos conflitos perpassaram séculos e deram origem a diferentes nações (Uruguai, Argentina, Paraguai, sul do Brasil). O massacre dos nativos, o estabelecimento e a caída do vice-reino do Rio da Prata[2], a Guerra da Cisplatina[3] e a independência do Uruguai, a Revolução Farroupilha, as guerras de fronteira, enfim, o pampa foi cenário desses e de outros acontecimentos. Ainda nesses locais, imigrantes de diferentes pátrias estabeleceram colônias, pondo em prática a eterna busca pela felicidade. Nossas cidades - inclusive Santa Maria - e nossa gente são conseqüência das ações desses tempos remotos. Guerras e calmarias, farturas e misérias, suor e sangue – eis o pampa.

Trecho de Tropa Amarga,
De Luiz Menezes

No êxodo triste
Os olhares são preces
Num cântico bárbaro;
Perduram só lendas
Oriundas de glórias
De há muito sepultas.
Olhai essa tropa
Senhores de terra
De nomes ilustres,
E vejam o abismo
Cavado na senda
Por forças ocultas...

Penetrem no rancho
Senhores de terra
De nomes ilustres,
E vejam o Pampa
Aquecendo tristezas
Num fogo de chão...
E ouçam o ronco
De cuia de mate
Gritando revolta,
Da terra que amamos
Do amor que é fartura
Do trigo que é pão.
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Por esses e por outros motivos que a llanura pampena tornou-se objeto da literatura. Personagens como Martín Fierro, de José Hernandez; Pablo Luna, de Eduardo Acevedo Díaz; e Blau Nunes, de João Simões Lopes Neto, são algumas das muitas figuras criadas que retratam algumas características do pampa e das pessoas que o habitam.

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Escrevi esse intróito sobre o pampa para tentar contextualizar o cenário da obra que será abordada neste post: Netto Perde a Sua Alma, de Tabajara Ruas. A história é uma ficção sobre o general farroupilha Antônio de Souza Netto[4]. Apesar disso, o livro mescla no enredo datas e acontecimentos reais.

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Tabajara Ruas é escritor e cineasta gaúcho, nasceu em Uruguaiana, no dia 11 de agosto de 1942. É autor das obras O Amor de Pedro por João, A Região Submersa, Perseguição e Cerco a Juvêncio Gutierrez, dentre outras. Em 1999, co-redigiu com Beto Souza, roteirizou e produziu o longa-metragem Netto Perde a Sua Alma, baseado em seu livro de mesmo nome.

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A história começa no dia 1o de julho de 1866, no Hospital Militar de Corrientes, República Argentina, para onde o general Antônio de Souza Netto foi levado após ser ferido na batalha de Tuiuti, no segundo ano da Guerra do Paraguai (1864-1870). Ali percebe coisas estranhas acontecendo com outros pacientes ao seu redor. Numa noite, recebe a visita de um antigo companheiro, sargento Caldeira, ex-escravo. Juntos rememoram o passado comum durante a Revolução Farroupilha (1835-1845). Eis uma passagem:

- O conselheiro recebeu uma carta do capitão Garibaldi.
- Oigaletê! Uma carta do corsário! Então ele ainda está vivo.
- Bem vivo e campeante. É uma carta da Itália. Parece que hoje ele é general. (...) Pergunta pelos companheiros da Revolução de 35.(...)
- O conselheiro Domingos teve a bondade de copiar trechos da carta do capitão Garibaldi, general, e pediu que se fosse possível, que eu le mostrasse.
- Leia no más.
O sargento Caldeira empostou a voz:
- “Eu vi batalhas mais disputadas, mas nunca vi em nenhuma parte homens mais valentes nem cavaleiros mais brilhantes que os da cavalaria rio-grandense, em cujas fileiras comecei a desprezar o perigo e a combater dignamente pela causa sagrada das gentes”
Netto Aprovou com a cabeça.



Netto acredita que o médico do hospital de Corrientes, o tenente-coronel Philippe Fointainebleux era um “francês pedante, falso no sorriso e brutal no tratamento com os inferiores” (2001, p.14). Deduziu isso a partir do procedimento do médico junto ao capitão de los Santos – um de seus companheiros de quarto - que teve suas pernas amputadas. De acordo com Netto, Fointainebleux fez isso por não gostar do capitão de los Santos.

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Na seqüência do livro, no hospital, o general Netto e o sargento Caldeira lembram ainda do jovem escravo Milonga, que se alista no Corpo de Lanceiros Negros, sob o comando de Caldeira. O personagem “Milonga” é muito interessante no decorrer da narrativa, pois é ele quem representa os anseios dos escravos que lutaram na Guerra dos Farrapos, e também da revolta dos soldados negros após a guerra.

Vilarejo de Poncho Verde, município de Dom Pedrito, Província de São Pedro do Rio Grande, 2 de março de 1845.

Viram um cavaleiro carregando uma lança se aproximar num galope urgente, levantando uma poeira rosada. O cavaleiro entrou no acampamento investindo sobre a soldadesca que precisou saltar para os lados para não ser atropelada, avançou até diante da tenda de Netto e estacou o cavalo a cinco metros dele.
Milonga era o cavaleiro. Ergueu a lança e atirou-a na direção de Netto. A lança cravou no chão, entre as botas de Netto, e ali ficou balançando.
- General mentiroso!
Netto sentiu uma dor súbita e estranha
- Vim pra le matar, general.
Osório levou a mão à culatra da pistola. Netto segurou seu braço. Olhou para o rapaz que um dia salvara sua vida. Tirou o palheiro da boca.
- Há quanto tempo, amigo Milonga.
- Eu não tenho amigos!
A mão esquerda de Milonga desceu até o coldre. Vários oficiais acorreram, mas Netto tornou a fazer o gesto. (...)
- A guerra terminou, Milonga.
- A guerra terminou e eu continuo escravo.
- Para mim tu não és escravo, Milonga.
- General, onde está a República que vosmecê proclamou?
- Ela não existe mais, Milonga.
- Vosmecê mentiu para nós.
- Não, Milonga, eu não menti. Apenas perdi a guerra. (2001, p.101-102)


São várias histórias, encontros trágicos, amigos e inimigos, amores e desafetos. Netto recorda o exílio em Piedra Sola, Uruguai, depois da derrota dos farroupilhas; o convívio com os fantasmas do passado; a descoberta do amor, com a uruguaia Maria Escayola e a Guerra do Paraguai. Naquela noite, no hospital, unidos por duras lembranças, revelações surpreendentes e um terrível segredo, os dois veteranos enfrentam o que parece ser o derradeiro desafio, que é assassinar o tenente-coronel Philippe Fointainebleux. Mas será que é só isso? Não.

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Parece tudo muito simples, só que o final do livro reserva surpresas. Obviamente que não serei eu a dizer quais são, senão perde a graça! Há certos detalhes no meio das recordações que permitem pensar no final, só que na primeira leitura do livro esses detalhes passam desapercebidos e são tidos como insignificantes (pelo menos foi a minha impressão na primeira vez que li o livro); mas não são.

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Quando se viaja para a região pampiana em noites de inverno, observam-se campos que se perdem no horizonte, aparentemente desolados e despovoados, iluminados unicamente pela luz da lua e preenchidos por um minuano (vento) cortante que às vezes sopra tão forte pelo descampado que chega a parecer vozes de personagens de noites antigas, o que causa um sentimento de angústia. Em geral nem ao menos pensamos no que deve ter ocorrido nesses locais em épocas passadas. Netto Perde sua Alma traz à tona eventos sucedidos nestas mesmas terras há mais de um século e meio. Quando adquirimos consciência que sabemos tão pouco sobre os lugares que chamamos de ‘casa’, sentimos uma profunda nostalgia. É esse sentimento que estou sentindo agora, enquanto termino de escrever.
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[1] http://es.wikipedia.org/wiki/Pampa_%28Sudam%C3%A9rica%29
[2] http://es.wikipedia.org/wiki/Virreinato_del_R%C3%ADo_de_la_Plata
[3] http://es.wikipedia.org/wiki/Cisplatina
[4] http://pt.wikipedia.org/wiki/Ant%C3%B4nio_de_Sousa_Netto