sábado, 28 de março de 2009

Especulações sobre a Dor e a Morte


Outro dia certo professor indicou um conto de Humberto de Campos durante uma aula de Laboratório de Jornalismo Impresso III. Em O Monstro, a dor e a morte teriam tentado participar do processo de criação, ao dar vida a um ser “plagiado da obra divina”. Mesmo diferente de tudo que já fora visto, ele possuía reminiscências dos outros seres. Tal ser alarmou a Criação.

Dentre as especulações sobre o porquê disso, uma das possibilidades foi a de que a dor e a morte não costumam participar do processo de criação. Os debatedores - mesmo inseguros sobre o que diziam - explicavam que a morte e a dor seriam coisas ruins, contrárias à vida e àquilo que é considerado bom. Por isso, então, que um ser criado a partir delas seria rechaçado por aqueles naturalmente concebidos.

Algumas inquietações surgiram então a respeito disso. Será que a dor e a morte realmente são vilãs? Será mesmo que o seu único objetivo é afastar o homem daquilo que ele procura (a felicidade, por exemplo)? Quais são os seus papéis? São questões difíceis de serem respondidas (se é que não são impossíveis). No entanto, podemos fazer aquilo que todos costumam fazer quando não conhecem algo: especular.

Sabe-se que toda e qualquer criação tem por fim a excelência. Faz sentido. Afinal, aquilo que é gerado sobrevém graças a um ato de amor e dedicação, desde o títere produzido pelo seu artífice até a concepção de um ser. A diferença é que no primeiro caso o produto é produto de algo que também é criatura, sendo, dessa forma, potencialmente perfeito, mas refletindo em ato as imperfeições do seu criador; a segunda situação ilustra o ato que permite que a natureza continue seu ciclo. Mesmo que seja quase impossível decifrar esse movimento (já que somos criaturas limitadas), uma coisa é certa: a natureza sabe o que faz.


A criação de Adão (detalhe) - Michelangelo
1508-1512


E qual é o papel da dor e da morte na criação? Nenhum. A explicação está na observação da própria natureza. Ela revestiu o processo de concepção com a veste do prazer, e agraciou o seu produto com a vida. Tudo isso para ter os seus desígnios atendidos.

Enganam-se, no entanto, aqueles que crêem que a morte e a dor foram enganadas. Assim como as outras criações, elas também servem aos propósitos da natureza. Elas não erram, e também não se enganam. Elas não criam, mas agem naquilo que foi criado. E elas não são boas ou más, como o homem costuma rotulá-las.

O homem caracterizou a dor como uma afecção negativa, definindo-a como algo oposto ao prazer. Enquanto que o prazer seria o prêmio pelo bom emprego dos esforços humanos, a dor seria o castigo pelas más ações. Suas mãos, no entanto, não servem simplesmente para magoar os corpos dos seres humanos; muito pelo contrário, ajudam a edificar o seu espírito. Seu toque é frio e triste, mas, durante a vida, é graças a ele que se aprende a dar valor às coisas que realmente valem o sacrifício. “A verdadeira medida de um homem não se vê na forma como se comporta em momentos de conforto e conveniência, mas em como se mantém em tempos de controvérsia e desafio” – disse certo Luther King Jr. E a dor está nesses tempos de medida sempre à espreita, tomando em seus braços todos aqueles que estão em dificuldades.

O caráter de alguém amadurece quando é posto a prova, seja na observação de um ato injusto, ou ainda no sofrimento alheio, ou ainda na perda de uma pessoa querida. Como viver bem? Normalmente essa pergunta é empregada a si mesmo somente quando se está sofrendo. Sem falar na grande fonte de inspiração que ela é. Obras literárias, músicas... Enfim, são poucas as entidades que rendem tantos bons produtos quanto a dor.

Felicidade? Alegria? Bonomia? São os fins últimos de todas as nossas ações, como já disse o velho Aristóteles. Afinal, tudo o que se faz é com o intuito de ser feliz. Mas para alcançar tais objetivos, o homem necessita passar por uma jornada solitária para definir quais são as condições e escolhas necessárias para tal. A dor é a sua fiel companheira nesse percurso.


Pietà - Michelangelo.
esculpida entre 1497 e 1499

Outra injustiçada, representada sempre em vestes negras e com uma grande foice na mão é a morte. É o seu sopro que apaga a luz oferecida pela natureza a todos os seres no momento da criação. Dela, muitos tentam fugir, seja não pensando na sua existência, seja ignorando a velhice e tentando agir como um gurizote, por mais que geada dos anos cubra de branco os seus cabelos. Eles Ignoram que a natureza colocou-a no fim do percurso de todo ser não para castigá-lo, mas porque ela necessita disso para continuar seu ciclo. “Reparai que somos sábios se seguimos a natureza como um deus, curvando-nos às suas coerções. Ela é o melhor dos guias”, observou Cícero a seus contemporâneos. Disse ainda ele, “Aliás, não seria verossímil que, tendo disposto tão bem os outros períodos da vida, ela se precipitasse no último ato como o faria um poeta sem talento. Simplesmente, era preciso que houvesse um fim; que, à imagem das bagas e dos frutos, a vida, espontaneamente, chegada a sua hora, murchasse e caísse por terra. A tudo isso o sábio deve consentir pacificamente. Pretender resistir à natureza não teria mais sentido do que querer – como os gigantes – guerrear contra os deuses”.

Saber que um dia ela virá desempenhar seu papel não deve ser motivo de tristeza e de medo, pois é graças à ciência da sua inevitabilidade que o homem busca viver da melhor forma possível o tempo que lhe foi dado. É possível que um imortal de 800 anos não conseguisse aproveitar mais do que um homem que vivesse apenas 80, ciente que seu tempo acabaria um dia.


Tânatos era a personificação da morte na Mitologia Grega. Diz-se que Tânatos nasceu em 21 de agosto, sendo a sua data de anos o dia favorito para tirar vidas. (fonte: Wikipédia)
Autor da imagem desconhecido.


Sobre ela, os gregos conjeturavam que era impossível saber se existe algo após o seu abraço. Mesmo acreditando no Hades, sua maior preocupação era viver bem o tempo que lhes fora dado e, no final do percurso, ficar tranqüilo por saber que foi possível participar do ciclo natural e obedecer aos desígnios da natureza.

Ter consciência de que, cada uma a seu tempo, a dor e a morte fazem parte da existência humana permite que o indivíduo valore ainda mais o tempo que lhe é disponível; busque a melhor maneira de aproveitá-lo. É por isso, talvez, que o verdadeiro sábio vislumbra o amanhã sempre com tranqüilidade, e aproveita cada fase da sua vida da melhor maneira possível. Isso é ser Homem. E é essa a mensagem que os gregos quiseram passar ao eternizar a máxima “tenha coragem de ser homem e não queira ser um deus”.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

O amor e o medo

Em Memórias de minhas putas tristes, o colombiano Gabriel Garcia Márquez narra as memórias de um homem que está prestes a completar 90 anos e decide ter, como presente de aniversário, uma noite de amor com uma jovem virgem. Mas se engana quem pensa que se trata da história de um velho safado, acima de tudo é uma história de amor, esse sentimento tão falado e ao mesmo tempo tão temido. O narrador passou 90 anos fugindo da possibilidade de amar alguém – inclusive abandonou a noiva no altar – e depois de velho é que se rende a esse sentimento com uma jovem com quem tem uma relação pura.

Mais do que um romance, Memórias... é uma reflexão sobre o tempo que passa sem que percebamos; e como deixamos de fazer coisas que desejamos, inclusive, e principalmente, amar, por medo ou acomodação. O tempo parece tão longo, mas passa rápido, muito rápido. Tal qual o narrador, muitas pessoas procuram em amores falsos a forma de não pensar em amores verdadeiros, e sobre isso ele diz uma frase emblemática: “O sexo é consolo que a gente tem quando o amor não nos alcança”.

Após ler esse livro me pareceu uma grande idiotice perder tempo e temer sentir algo por alguém, não apenas com uma conotação erótica, mas com todos os sentidos que a palavra amor pode ter. Afinal, por que tememos tanto se abrir e confiar em alguém? Não importa a idade, 20 ou 90 anos, o tempo é sempre o espaço curto de viver. Então, vamos aproveitar o momento para amar alguém, sem medo.

Para ler começo deste livro, clique em http://revistaepoca.globo.com/Epoca/0,6993,EPT991765-1655,00.html

No link http://www.speculum.art.br/module.php?a_id=328 é possível saber mais sobre a vida do escritor

E para ler mais alguns textos de Gabo, é só ir ao site Releituras em http://www.releituras.com/ggmarquez_menu.asp

segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Empeiría*

Blogosfera segundo um gráfico de Alex Girard


*Experiência em grego.

Sobre ela já dizia o velho Aristóteles: “a ciência e a arte vêm aos homens por intermédio da experiência”[1]. A idéia é velha, muito velha, mas possui grande sentido até hoje. Foi sabendo disso que vestimos a camisa do ¡Sopão de Letras!, para começar a aprender (a locução indica modéstia) a fina arte de lidar com o meio digital.

Como disse a nossa colega Cibelli Fogliato, o objetivo do blog de forma alguma foi fazer jornalismo, apesar de sermos estudantes de jornalismo. A idéia foi a de se ambientar com o meio digital, para aprendermos a lidar com o emaranhado de possibilidades de comunicação que constitui a blogosfera
[2]. A princípio a postagem regular e a pesquisa constante foram obrigações outorgadas pela disciplina de Laboratório de Jornalismo Digital II; por fim, essas atividades tornaram-se um prazer, o que transformou com o tempo a “amarga tarefa” da disciplina em “aprazível diversão”.

Se considerarmos o contato com a blogosfera como o objetivo geral do trabalho, então parece que conseguimos atingi-lo, como ressaltaram os colegas Piero Pedrazza e Maurício Sena. Entretanto, não creio que nosso contato tenha sido profundo. Com certeza ainda temos que amadurecer muito. Prova disso é o fato de que até o momento a maioria dos nossos leitores adveio de sites de busca; poucos são os leitores que entram no blog diretamente pelo nosso endereço. A segunda maior fonte de acessos são os blogs dos nossos colegas, que nos linkaram e que são linkados por nós
[3].

Pretendo continuar a postar escritos no ¡Sopão de Letras!, pois além de ser um exercício de aprimoramento no meio digital, é também uma forma de melhorar a qualidade da minha modesta redação (criticada em
outro blog). Nosso objeto de discussão, a literatura latino-americana, é com certeza um prato deveras aprazível; por isso a partir de agora tentarei escrever de modo que o conteúdo da sopa não cause indigestão e nem esteja caliente o suficiente para queimar o esôfago de alguém.

Para finalizar, eu gostaria de dizer que este relato é o último obrigatório dentre os membros do grupo responsável pelo ¡Sopão de Letras!. A partir de agora, o blog passa a funcionar de maneira autônoma, já que sua obrigação para com a disciplina de Laboratório de Jornalismo Digital II está cumprida. Aos leitores, sejam bem-vindos para participar, tanto escrevendo quanto dando sugestões de leitura. Algumas modificações serão feitas no blog (algumas por vontade nossa, outras involuntárias) . A principal, e que posso adiantar agora, é o fato de que a estrutura de postagens diárias será impossível. Entretanto, o blog será atualizado na medida do possível. Nesse aspecto o assunto abordado pelo blog facilita nosso trabalho.


É a experiência que nos tornará virtuosos, já dizia o velho Aristóteles. Da memória à experiência, à arte e ao conhecimento. Sirvam-se, tem sopão para todos!


[1] Aristóteles, Metafísica, I, 1, 981a 3
[2] "Os blogs, de uma maneira geral, têm como um elemento constitutivo fundamental a criação de links com seus congêneres, num movimento de construção de comunidades de informação, que se retro-alimentam, checam e comparam dados e interpretações, produzindo a multivocalidade que caracteriza a Blogosfera" PALACIOS, Marcos. Blogosfera e jornalismo on-line no Brasil: Porque Noblat, Josias e cia. não fazem Blogs. In: http://docs.google.com/View?docid=adf4grpvfm38_28gc7rm9. Acesso em 17.12.2007.
[3] Essa análise é possível graças ao Sitemeter.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Isso não é adeus, é até logo...

Concordo plenamente com meus amigos e companheiros do blog: a experiência adquirida participando da blogosfera suplanta horas – e livros – de teoria. Para falar deste blog é imprescindível falar do semestre passado. Como esquecer todas as tardes que a turma passou discutindo sobre o ambiente digital? Não foram poucas as vezes que saímos do 74 de noite, um frio desgraçado, ainda discutindo os (muitos) textos que havíamos lido. Um dos temas que mais provocou estranhamento foi, justamente, a blogosfera. Como a maioria nunca tinha postado na vida, isso era algo realmente nebuloso, sem falar na grande questão: é possível fazer jornalismo em um blog? Isso, confesso, não sei responder: tem a teoria, o habitus, o nosso amado Bourdieu... De qualquer forma, a proposta não era fazer um blog de jornalismo, mas participar do ambiente digital.

Quando montamos o grupo para construção do blog, tivemos dificuldades para escolher um tema capaz de agradar os cinco integrantes. Apesar de todos sermos amigos, os gostos, muitas vezes, são díspares. Como alguns integrantes gostam de Animes, “inscrevemos” nosso blog com esse tema no semestre passado; paralelamente, porém, discutíamos uma forma de conciliar o interesse de todos. A resposta veio uma semana antes de iniciar o blog, por sugestão do nosso filósofo Jorge Robespierre: se todos gostavam de ler, por que não um blog sobre livros? A proposta foi aceita por todos e começamos a escrever.

Ler um livro por semana foi a melhor e a pior coisa na construção do blog. A necessidade de cumprir a tarefa me obrigou a ler muitos livros que eu “namorava” na biblioteca, mas não lia por falta de tempo - foi graças ao blog que eu descobri Álvaro Mutis, um autor colombiano desconhecido até por aqueles que gostam de literatura latino-americana. Porém, conforme os trabalhos da faculdade se acumulavam, ler um livro por semana mostrou-se uma tarefa árdua: muitas vezes não dormi para ler “o livro do blog”.

O objetivo inicial do trabalho – inserir-se na blogosfera e no ambiente digital –, creio, foi alcançado. Trabalhar com hipertexto, aliás, foi um aspecto bastante gratificante do trabalho, pois a necessidade de conseguir links interessantes para os nossos leitores nos obrigou a navegar muito na Internet. O blog continuará existindo, agora sem a pressão de valer nota para a cadeira de Digital II. Eu pretendo continuar como mestre-cuca com a companhia de meus valorosos amigos. Aos nossos leitores, até logo!

quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

Experiência

"Experiência: ato ou efeito de experimentar; habilidade e perícia adquiridas com o exercício de uma arte ou ofício". Ratificando as palavras dos amigos Piero Pedrazza e Maurício Senna, experiência bastante válida e estimulante. Apesar de estar atrelada a uma disciplina do Curso de Jornalismo, a liberdade de escolha do tema e organização das postagens foi talvez um dos fatores que mais contribuíram para tornar a atividade tão gratificante.

No início, a idéia de participar pela primeira vez da construção de um blog, associando a literatura com esta ferramenta relativamente embrionária, pareceu-me um tanto incerta em relação a sua efetividade. Não são muitos os blogs construídos a partir de análises ou mesmo comentários de obras literárias. Além disso, por desconhecer a dinâmica de um blog, imaginei que dificilmente iríamos inserir nosso trabalho na blogosfera.


Passadas as primeiras postagens, os resultados começaram a aparecer. Amigos e conhecidos para os quais eu jamais falei sobre a participação no "Sopão de Letras" elogiaram o nosso trabalho. Através dos comentários, concluí que essas pessoas estavam realmente lendo os nossos posts, assim como o que você leitor está fazendo neste exato momento. Isso prova que eu estava significativamente equivocado com relação à suposição inicial. Ainda bem.


A disciplina de Laboratório de Jornalismo Digital será concluída, mas o "Sopão de Letras" vai continuar de forma independente e provavelmente com novos mestres-cucas. Independentemente das trocas de integrantes ou novas dificuldades relacionadas à conciliação da atividade com a graduação, pretendo continuar contribuindo com o blog. Então, para todos vocês leitores, até a próxima postagem.